sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Contos do Amante da Morte [Semana 20]

Autora: Mari-Youko-Sama
Capítulo 17: Nostalgia e Remorso

As planícies rubras retornavam àqueles tons conhecidos que as nomeavam e de volta ao cerco regional de Haldris, Marcos enxergava a paisagem com outros olhos em um misto de nostalgia e remorso.

Seguia sozinho a cavalo com um manto escuro e empoeirado de terra vermelha, tinha sido acompanhado por uma escolta de dois soldados de Gernot até as fronteiras, e dali por diante, o jovem Blackwood seguiu apenas na companhia de seus pensamentos.

Ao refazer as trilhas conhecidas, algumas agora tomadas pelos ramos que cresceram na primavera e secaram no verão, sentia como se o peso do mundo estivesse em suas costas, embora não fossem mais que os poucos sobreviventes daquela região. Em sua mente, não sabia como chegaria ao novo Infante, que provavelmente teria muitas outras ocupações do que receber um soldado desertor: como ele provavelmente seria compreendido naquela situação.

A única pessoa que poderia servir de interlocutor seria Matheus, por ser um clérigo, e era de conhecimento de todos que Dastan, filho de Vincent Audhild, era incrivelmente devoto de Manda, a deusa do Oculto. Mas pedir esse favor a Matheus significava colocá-lo em uma posição perigosa naquela guerra.

– Será que deveria conversar com “ela”? – os pensamentos de Marcos parafraseavam até onde alguém como Apony poderia estar envolvida em um conflito como este, ou sequer, se ela se importaria com tudo isso. Tinha prometido encontrá-la quando voltasse, mas imaginava isso acontecendo quando a guerra de fato tivesse acabado e não em meio a uma manobra política.

Sem dar-se conta, o jovem Blackwood guiou as rédeas de seu cavalo para o interior de um denso bosque com amendoeiras desfolhando, fez caminho até uma clareira onde uma figueira destacava-se na paisagem.

Desmontou e se aproximou da árvore retorcida que mantinha alguns entalhes inscritos em seu tronco:

– Não sei o que fazer – admitiu em tom cansado, como se confidenciasse para a árvore – voltei vivo, cumpri o que prometi, mas se não fizer como Gernot me disse, por quanto tempo mais viverei? Por que alguém como eu tinha de ser escolhido para algo tão importante? Será que conseguirei… – acariciou os desníveis no tronco relendo as inscrições – me diga mãe… o que tenho de fazer? O que posso fazer? – sussurrou esperando uma resposta ou ao menos uma inspiração.

Mas diferente do esperado, um outro som conhecido chegou aos seus ouvidos. Marcos virou-se de súbito ao reconhecer aquele miado rouco, deparando-se com a figura de um lince, já adulto em meio às folhas, observando-o curioso:

– Lirou!? – o tom de surpresa era perceptível em sua voz e expressão, mas o animal correu mata adentro. O jovem Blackwood seguiu, deixando para trás seu cavalo, afinal se fosse realmente Lirou, isso indicava que talvez Matheus estivesse nas imediações.
Mas não teve tempo de alcançar o felino, após desvencilhar-se das raízes bosque adentro, uma silhueta feminina de manto em meio às sombras chamou atenção de Marcos, que imediatamente parou:

– Apony!?

“Quando pensamos que temos alguma importância, é quando somos mais insignificantes”


Ir para o próximo capítulo de "Contos do Amante da Morte"

Nenhum comentário:

Postar um comentário