sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Filho das Profundezas [Semana 21]

Autor: Marco Fischer
Parte XXI - Chuva de Outono

Chuva de Outono descia apressadamente até os compartimentos inferiores do navio, se esgueirando entre os companheiros que recarregavam seus arcabuzes com coronha de madeira crua. Acima de sua cabeça, era possível ouvir o som das criaturas-peixe arranhando as tábuas do convés, o que só aumentava a sensação de urgência.

Ela precisava se certificar de que o Maleko estava seguro em seu pequeno aposento. Sabia que Violka ficaria muito triste se algo acontecesse a ele, e também era a única ali que podia explicar ao garoto o que estava acontecendo. Todos a bordo do Hummingbird tinham que ficar juntos para enfrentar aquelas coisas, e isso incluía seu novo amigo.

A tempestade fazia com que o navio balançasse de um lado para o outro, mas a elfa agilmente saltava de lado cada vez que a embarcação se inclinava demais. Esticando seu corpo através da entrada do porão, Chuva de Outono olhou em todo lugar a procura do Maleko, mas ele não estava lá. Um buraco havia sido feito no teto, dando para uma das portinholas mais afastadas do convés inferior.

A navegadora sentiu um nó na garganta e apanhou seu arco das costas, colocando uma das flechas de prontidão para acertar uma das criaturas e fugir depois de encontrar seu amigo. Mas o buraco era pequeno demais para o corpo robusto e escamoso dos híbridos-peixe, e havia sido aberto por algum tipo de explosão concentrada de dentro para fora, sem qualquer rastro de pólvora.

O Maleko havia fugido, era tudo que ela sabia. Tinha voltado para casa talvez, sem se despedir de ninguém. Ou tinha fugido daqueles monstros que atacavam o navio. Será que eles tinham vindo buscá-lo? Era tarde demais agora. Chuva de Outono precisava conter a dúvida e o remorso em seu coração, e voltar a ser a elfa alegre e esperta de sempre.

Com Violka na ilha e Stevo morto, ela era a única chance da tripulação escapar. E ela só conseguiria fazer isso se deixasse as preocupações de lado e voltasse a enxergar tudo como uma grande brincadeira, deixando a imaginação fluir e com ela seus sortilégios. O som dos tiros dos arcabuzes e o gorgolejar das criaturas a guiavam até o palco onde faria seu número especial de magia élfica.

Filha prematura do pântano e da decadência
Desperte de seu torpor e liberte sua essência

O broto murcho na palma da mão da navegadora se abriu com um estalido seco, liberando uma névoa esverdeada que como uma nuvem se espalhou entre as criaturas, as fazendo guinchar e se encolher de repulsa e náusea. Elas eram como peixes afinal de contas, e seus olhos e narinas sensíveis não toleravam aquela neblina tóxica e fétida.

Aproveitando a distração, a tripulação do Hummingbird fugiu de volta ao convés e escalou os cordames do navio, esperando pelos invasores com as armas apontadas. Quando as criaturas surgiram finalmente, desorientadas em busca de ar fresco, balas e flechas se derramaram sobre suas cabeças, caindo com força sobre elas como uma chuva de outono.


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